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Como estão nossos meninos?

  • danielaabarca
  • 19 de set. de 2018
  • 4 min de leitura


Precisamos cuidar dos nossos garotos, e não quero dizer com isso que as meninas ou mesmo as mulheres não demandam cuidados. No entanto, as estatísticas e o que acompanhamos diariamente nos noticiários, ou pior, bem perto no nosso cotidiano me deixa estarrecida e acredito que a muitos de vocês também.


Já deixou de ser diário sabermos de casos de feminicídios, segundo um levantamento publicado no canal G11 somente em 2017 foram 946 mulheres assassinadas por sua condição de gênero. Para além deste crime, hoje no Brasil segundo a CNJ2 (Comissão Nacional de Justiça) 95% de nossa população carcerária é masculina. Publicado em junho deste ano, o Mapa da Violência 20183 traz que dos óbitos de homens jovens (15 a 19 anos) quase 57% se deu por homicídios. Os dados do INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais) do último censo do Ensino Superior em 20164 apontava que de todas as pessoas que concluem sua graduação 61% são meninas, poderíamos pensar que este percentual sempre será maior já que a população feminina é maior no país, mas vemos que quando se olha para o número de matrículas, este é mais equilibrado, dos matriculados para o ensino superior 57% são mulheres. Os homens concluem menos seus estudos.


Infelizmente poderíamos listar outros tantos dados que deflagram esta necessidade de cuidarmos de nossos meninos. Falo meninos por acreditar que é no começo da vida onde podemos exercer maior influência sobre a educação de nossos pequenos. Veja que coloco em termos relativos, pois sabemos que não formamos nossa personalidade somente a partir do que vivemos e apreendemos do ambiente, como bem nos sinalizou Freud em suas Séries Complementares5. Igualmente desafiador e leviano seria decretarmos as causas para este cenário, no máximo, podemos levantar hipóteses e como sempre, propor a ampliação do debate de ideias.


O sexo frágil tem se mostrado, e não é de hoje, ser o sexo masculino. E talvez precisemos discutir o que é fragilidade. A agressividade é inata ao ser humano, disso não podemos fugir. Ser agressivos não representa apenas maltratarmos o outro, mas a agressividade - se bem empregada - nos ajuda a dar cabo de nossos sonhos e projetos, é ela quem muitas vezes nos impulsiona nos momentos de dúvida. A nós, cabe olharmos com cuidado qual o destino que estamos dando a nossa carga agressiva. Quanto mais forte for o ego de alguém, e aqui podemos entender ego como autoconhecimento, reconhecimento e aceitação do outro como diferente, maior será a probabilidade (sim porque não cabem certezas e exatidão na ciência humana) de deslocarmos esta agressividade para fins mais saudáveis.


Nos primórdios da psicanálise Freud nos traz que no início de seu desenvolvimento o menino em seu conflito edipiano encara o pai como um rival que necessita ser eliminado a fim de que possa enfim tomar seu lugar junto a mamãe amada, ao mesmo tempo, teme este rival que afinal de contas pode lhe punir por tais desejos, e ainda como uma terceira possibilidade, anseia tomar o lugar da mãe como objeto de desejo do pai a quem tanto admira. Só por esta brevíssima colocação já conseguimos ver o quão complexo é a tarefa do pequeno garotinho.


Ainda que tenhamos todo o amor do mundo por nossos garotinhos, ninguém poderá resolver por eles todos estes conflitos que fazem parte da constituição humana, será necessário que ele viva cada um deles e possa encontrar à sua maneira de lidar com cada um deles. Contudo, nos cabe refletir que tipo de cenário este menino tem vivenciado. Temos acompanhado muitas mudanças na sociedade moderna no sentido de luta por condições e direitos igualitários entre homens e mulheres, mas sabemos estar longe disso. Para muitos homens ainda recai a cobrança de serem fortes (lê-se não expressar sentimentos), não levar desaforo para casa (devolver a agressão ora recebida), não voltar atrás em suas posições (homem tem que ser decidido), e tantas outras colocações infelizes que podem sobrecarregar os ombros já de nossas crianças que ouvem, consideram e copiam como grandes verdades aquilo que vem do mundo adulto.


Tá ok, entendi que a agressividade é algo comum a todo ser humano, mas como saber se a dose de agressividade que meu garoto/adolescente/menino apresenta está fora dos parâmetros? O termômetro é o mesmo que nos impõe a vida em sociedade, sempre que o nosso direito esbarra no direito de outra pessoa algo não vai bem. Segundo Winnicott, outro grande nome da psicanálise, estudou por anos a relação entre privação e delinquência e publicou seus achados em um livro6 fantástico de mesmo nome. Neste livro Winnicott nos traz que o comportamento delinquente, antissocial revela sempre uma carência. Como um comportamento cobrador, a agressão expressa e exige algo que a seu ver, dentro da realidade psíquica do indivíduo e não necessariamente a partir da realidade concreta, lhe foi tomado ou recusado.


Este é um convite que cabe a todos nós, nos momentos de maior raiva nos perguntarmos o que sinto falta neste momento, o que não tenho que me revolta desta forma? Claro que longe de ser uma fórmula mágica, muitos de nós precisa de um acompanhamento neste processo de autoconhecimento, que é a psicoterapia, o olhar e escuta profissional na busca pela ampliação do contexto que comumente nos é tão estreito. Mas é um exercício que cabe a qualquer das nossas relações, inclusive com nossos meninos, o exercício da observação atenta. Seja ao que ele ouve como crenças e verdades a sua volta, as exigências e expectativas que vamos sem nos darmos conta depositando sobre eles, a conversa franca e interessada não só no que ele fez no seu dia escolar, mas também como se sentiu no dia de hoje, que situações viveu atrelada a que sentiu em cada uma delas. Podemos estimular nossos pequenos homens a mudar a imagem que homem que é homem não fala sobre sentimentos. Sim eles são capazes e precisam falar o que sentem, chorar suas dores, respeitar e amar o diferente. E você? De que forma se implica nesta questão?

1 https://g1.globo.com/monitor-da-violencia/noticia/cresce-n-de-mulheres-vitimas-de-homicidio-no-brasil-dados-de-feminicidio-sao-subnotificados.ghtml Acessado em 13/09/18 às 14:00

2 http://justificando.cartacapital.com.br/2018/08/08/cnj-divulga-os-mais-recentes-dados-sobre-a-populacao-carceraria-no-brasil/ Acessado em 13/09/18 às 14:10

3 http://www.forumseguranca.org.br/publicacoes/atlas-da-violencia-2018/ Acessado em 13/09/18 às 14:20

4 http://portal.inep.gov.br/web/guest/sinopses-estatisticas-da-educacao-superior Acessado em 13/09/18 às 14:40

5 Freud, Sigmund 1915; Conferências Introdutórias sobre Psicanálise, Parte III, Conferência XXII in: Edições Standard das Obras Completas; Rio de Janeiro; Imago Ed.; Vol. XVI; 1996

6 Winnicott, W. D.; 1987 Privação e delinqüência. Trad. de Álvaro Cabral. São Paulo: Martins Fontes, 1984.

Chico Buarque em 1981 gravou "O meu guri" música belíssima que com profunda sensibilidade fala entre muitas interpretações possíveis do masculino a partir da visão da mãe, vale o deleite!

 
 
 

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